Nas últimas semanas do verão, os prontos-socorros da capital e do
interior de São Paulo começaram a receber um tipo de paciente que só era
esperado a partir de maio. Um fluxo constante de pessoas com febre
persistente acima de 38,5 graus, dores no corpo, cabeça latejando – sem
que a dengue pudesse ser responsabilizada. O movimento atípico disparou o
alerta: os vírus influenza, causadores da gripe, chegaram mais cedo ao Brasil. Em especial, o A (H1N1), popularmente chamado de vírus da gripe suína, responsável pela grande pandemia de 2009.
De janeiro a março de 2016, o Brasil registrou 225 casos de síndrome
respiratória aguda grave (SRAG) provocada pelos diferentes tipos de
influenza. Ela é caracterizada por falta de ar e outras complicações que
exigem internação e podem matar. Em 188 dessas ocorrências, a presença do vírus A (H1N1) foi confirmada. Ele matou 30 pessoas (dados até 12 de março).
Em menos de três meses, o número de casos supera o total do ano inteiro
de 2015 – quando ocorreram 141 registros e 36 óbitos. O Estado de São
Paulo é o mais atingido: 157 casos e 23 mortes.
As estatísticas não são um retrato fiel do que ocorre nos corredores
dos hospitais porque as instituições são obrigadas a notificar apenas os
casos graves. Nos últimos três meses, milhares de brasileiros devem ter
sido infectados pelo vírus. Todas as formas de gripe podem se tornar
graves. O H1N1 causa mais preocupação porque, além de idosos e crianças,
costuma vitimar outros grupos: as grávidas, os jovens, os diabéticos e
os obesos.
“Estamos vendo o início de uma epidemia fora de época e
ainda não sabemos a razão disso”, diz o infectologista Esper Kallás, do
Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. É possível que o vírus tenha sido
reintroduzido no país por viajantes que vieram de regiões onde ele é
endêmico (como a Europa ou os Estados Unidos). “Se eu estivesse numa
cadeira no Executivo, tentaria apressar a vacina”, afirma.
Nesses momentos em que a natureza subverte o planejamento, a capacidade
de reação dos governos é colocada à prova. Mais uma vez, ela parece
limitada. “Gostaríamos de antecipar a vacinação, mas o produto ainda não
está disponível. Existe um impeditivo tecnológico”, afirma Claudio
Maierovitch, diretor de Vigilância das Doenças Transmissíveis do
Ministério da Saúde.
A composição da vacina contra a gripe é atualizada a cada ano pela
Organização Mundial da Saúde (OMS), de acordo com as mutações sofridas
pelos vírus. Em setembro, a OMS divulga a formulação das doses do
inverno seguinte e os fabricantes começam uma corrida contra o tempo. A campanha de vacinação do Ministério da Saúde começará apenas no dia 30 de abril. Somente
os idosos; as crianças de 6 meses a 4 anos; as grávidas e as mulheres
no pós-parto; os doentes crônicos e os profissionais de saúde podem
receber a vacina no Sistema Único de Saúde (SUS). Na terça-feira (29), o
governo paulista anunciou a antecipação da vacinação para cerca de 3,5
milhões de pessoas. As doses de 2016 devem começar a ser distribuídas na
próxima semana.
O avanço da doença tem provocado uma corrida às clínicas particulares
de imunização, em São Paulo. As principais informam que a vacina
tetravalente (que protege contra duas cepas do vírus A e duas do vírus
B) só estará disponível em abril. O antiviral Tamiflu,
usado no tratamento da gripe H1N1, já está em falta em algumas
farmácias. Na semana passada, uma campanha de vacinação extra começou em
67 municípios da região de São José do Rio Preto, que concentra o maior
número de casos no Estado de São Paulo.
A vacina adotada pela Secretaria Estadual de Saúde é a do ano passado.
Protege contra o H1N1, o H3N2 e uma cepa do vírus B. É a única
disponível. “Espero que dê certo, mas ela demora cerca de 30 dias para
produzir imunidade”, diz Maierovitch. Quem receber a dose do ano passado
precisa tomar também a versão deste ano, quando for oferecida. Enquanto
isso, é provável que a epidemia continue a crescer e a expor as
limitações da assistência à saúde.
Fonte:Época
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